HEGEL E O SENHOR FERREIRA
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HEGEL E O SENHOR FERREIRA

HEGEL E O SENHOR FERREIRA


Hegel escreveu um dia que o livro da História apresenta em branco as páginas de felicidade.


Num livro, a maior parte das páginas contém caracteres, Com eles se constrói o entrecho. Mas a progressão do Espírito para o seu auge faz-se com lentidão e com todos os artifícios e cálculos de que a razão é capaz.

São espinhosos os caminhos da História. Partem da consciência e da Ideia com que nos servimos para retirarmos a conclusão de que todo o racional é real e de que todo o real é racional.


A consumação e o auge do Espírito decorre e atinge-se através dos bastidores do contraditório. Este também opera no plano da natureza. A flor esfolha-se e morre antes de originar o fruto, o que significa que alguma coisa de fundamental teve de morrer para que outra coisa de ainda mais fundamental pudesse viver.


O Espírito encerra-se neste jogo de contradições positivas. No plano do natural, o Espírito alienou-se nas coisas, deixou de ser algo "em si" , para poder passar a ser algo "por si", assimilando tudo o que já antes se fazia sentir. O último e decisivo momento é aquele em que o Espírito volta a si próprio, já enriquecido com as experiências do mundo natural, para ser finalmente uma realidade " em si e por si" , ou seja, para que finalmente se possa converter em Espírito Absoluto.


Hegel aborda o Todo, o real total, com uma terminologia de fortíssimo pendor abstractivo. Schopenhauer sempre o considerou louco e trapaceiro. Mas estas más-vontades são vulgaríssimas nas disputas filosóficas. É que cada pensamento possui uma ideosfera que lhe é própria. Impera o "espírito de sistema ".


Se estivermos atentos, iremos verificar que estas especificidades de abordagem ocorrerão em todos os contornos estabilizados e diuturnos de pensamento. Ouçamos um jurista profissional e verificaremos que a conceptualização de abordagem ao real é algo que é própria desse jurista, que o marca indelevelmente e da qual nunca se conseguirá libertar. O mesmo se diga dum electricista ou dum mestre-de-obras, de um arquitecto ou de um matemático.


Também a filosofia possui uma terminologia por cada filósofo. A de Hegel é radicalmente idealizada. Mas sendo-o, possui a ambição de nos desvendar os segredos de toda a realidade.


É evidente que estas pretensões de subsumir o mundo nos esforços desveladores da racionalidade poderá aparecer como megalómana. A filosofia dá-se mal com meios termos. Mas se agora estivermos atentos ao modo como se discute nesta rede social, verificaremos que a megalomania de Hegel é similar à megalomania discursiva do Senhor Ferreira .


Quem é o Senhor Ferreira ?


É o tipo acabado do interlocutor que quer ter razão em tudo o que sustenta. Está mesmo completamente persuadido da sua "boa razão". Em tudo.

Diremos portanto que as distâncias entre as ambições de Hegel e do Senhor Ferreira são mínimas. A única diferença é que só um deles foi filósofo ... E, tal como se disse no início do texto, ninguém gosta de apresentar um livro no qual nada esteja escrito.


@A.H.

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