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FALANDO DE SÍMBOLOS

FALANDO DE SÍMBOLOS

«Estamos cercados de símbolos e nem sempre nos damos conta disso. Não é só a bandeira nacional, o hino e o busto da República. Um símbolo densifica e sintetiza todo um universo de emoções. Não há símbolos emocionalmente neutros. Um emblema desportivo, um grande atleta - o Eusébio, por exemplo, no jogo contra a Coreia - , a casa onde vivemos a meninice, a velha árvore a cuja sombra um ente querido descansava, após o almoço, em tardes de Estio, um cheiro discreto a flor de laranjeira junto ao pomar de família, tudo isto poderá assumir o estatuto de símbolo. Porque recolhe pedaços da vida que nos marcaram para sempre. E porque todos eles se exprimem numa linguagem-outra, num significado que vai além da simplicidade dessas mesmas coisas.

Kant era o símbolo da pontualidade para os demais habitantes de Königsberg. E isto era assim porque durante toda a sua vida deu o mesmo passeio, pelo mesmo itinerário, respeitando uma mesma hora de passagem. E as pessoas gostavam disso, certamente respeitosas e talvez um pouco comovidas por verificarem que aquele pensador não era apenas fiel ao seu cogitar mas era também servidor impassível dos seus hábitos. Mas houve uma vez em que Kant alterou o seu curso. Fizera-se em França a Revolução de 1789 e o filósofo abandonou o seu trilho habitual para ir saber notícias de Paris. Que símbolo teria sido aquele para Kant ? O advento de uma Nova Idade ? A afirmação de um novo projecto antropológico ? Ambas as coisas e muito mais ? Que poderemos nós supor ? Só nós conhecemos o alcance do nosso universo simbólico. E este pode variar e ser questionado de várias formas. Durante tempos, a Justiça foi representada de olhos vendados, para significar que a sua aplicação ficava cega perante a diversidade dos estatutos pessoais ou económicos. Mas muitos outros vieram argumentar que essa imagem, de mulher vendada, não se elevava a um estatuto de pleno simbolismo, pois que a Justiça, com a sua balança numa das mãos, teria necessariamente de manter os olhos muito abertos para tudo poder anotar, na sua valoração salomónica.

Enquanto nos pudermos comover, enquanto possuirmos o sortilégio da linguagem emocional, nós, animais racionais, poderemos também considerar-nos objectos passivos e activos de todas as simbologias possíveis.»


@Autor: A. H. (2014)



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