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TOMAZ DA FONSECA: REPUBLICANO E MAÇON

ATA (ACTA ) DA CONFERÊNCIA TOMAZ DA FONSECA: REPUBLICANO E MAÇON


Tomás da Fonseca vivenciou uma experiência de seminarista para a rejeitar. E para a rejeitar não de uma maneira cordata, mas para a recusar com a maior das intransigências. Ou seja: no período mais decisivo da formação da personalidade individual, entre os 16 e os 26 anos, no lapso cronológico em que as opções verdadeiramente se assumem, Tomás da Fonseca começará a dizer para si mesmo que aquele não poderia ser o seu caminho e acabará por dizer a todos os demais, através dos seus livros, as razões de fundo da sua rejeição.

TOMAZ DA FONSECA: REPUBLICANO E MAÇON

Esta rejeição apresenta-se como um verdadeiro manifesto do radicalismo anti-teológico. Que queremos dizer com isto?

Queremos significar que a meditação em relação ao património de valores eclesiais e sacerdotais poderia salvaguardar um qualquer laivo de espiritualismo. O balanço da admissibilidade da existência do Divino consente e recomenda, em muitos casos, que se escolha como identificadora alguma forma de deísmo ou de teísmo, mesmo apesar da rejeição explícita das Igrejas institucionalizadas. Mas não encontramos este meio-termo no pensamento de Tomás da Fonseca. O que nele encontramos é uma decantada e irredutível posição de ateísmo. O que é valioso e singular no ateísmo de Tomás da Fonseca é que esse ateísmo se expressa de uma forma humanista. Ele recusa Deus porque ama os homens, ou, talvez dizendo melhor, ele recusa a ideia de Deus porque ama intensamente, profundamente, a ideia de Humanidade.

O humanismo ateu, que grassou na Europa sobretudo no decurso dos anos 30, 40 e 50 do século XX, iniciou a sua caminhada ainda durante o século XIX. Teve como antecessor natural o humanitarismo positivista de Augusto Comte, o qual abrirá o caminho para as abordagens cientificistas de toda a gama e natureza. Comte atém-se fundamentalmente, na sua forma típica de pensar, ao fenómeno, entendendo por fenómeno tudo o que surge de forma directa e evidente na plena luz da consciência analítica. Todo o fenómeno científico, segundo o positivismo comteano, se manifesta através da tela da sua dependência causalitária. Não existe um fenómeno que não seja provocado por uma causa eficiente. Assim, a compreensão do Universo só poderá operar-se através da identificação dos vínculos de causalidade que explicam a diversidade dos fenómenos naturais. Por seu turno, esta visão de mundo encontrava-se ao serviço do mais inegável de todos os fenómenos: a Humanidade. A ciência causalitária só encontra a sua justificação por se encontrar ao serviço da Humanidade.

No caso do Augusto Comte, este humanismo ainda era agnóstico. Significava isto que o problema da existência ou inexistência de Deus era colocado entre parêntesis, procedendo-se a uma “suspensão de juízo” que permitisse reforçar a eficácia da Sociologia, enquanto “ciência do social”.


Desta maneira, era forçoso que se mantivesse em relação à sociedade a mesma atitude mental com que um físico encarava a matéria ou um químico analisava a composição dos elementos componentes das coisas. O problema da existência ou inexistência de Deus não era tido em conta, pois só poderia ser um elemento de perturbação nesta demanda metodológica. O positivismo comteano , como se vê, acabava por ser um agnosticismo, uma vez que nada afirmava ou negava sobre Deus e se continha dentro da estrita esfera da metodologia científica. Deus passava por ser uma realidade ou um mito “essencialista”, sendo tais “essências” deliberadamente ignoradas dentro do contexto científico.

A atitude do ateísmo não é rigorosamente esta. Dá mais um passo em frente em relação a um discurso deste tipo. O ateísmo descambará fatalmente num materialismo totalizante. Afirmará que só a matéria existe, que tal matéria existe desde sempre e que as formas de vida não são mais do que as diversas combinatórias dessa mesma matéria. E, assim sendo, a ideia do divinismo ou da transcendência divina encontra-se completamente ultrapassada.

Foi por esta senda que Tomás da Fonseca enveredou. Mais: ele não se limitou a afirmar categoricamente que o Divino não existia e nunca tinha existido. Acrescentou a isto que a simples ideia de Deus integrava um tipo ou uma forma de mentalidade profundamente nociva para a Humanidade. [...]

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